Vol. 1 N° 2, julio-diciembre 2019, pag. 57-66

ISSN 2618-5520 online - ISSN 2683-7021 impresa

DOI - https://doi.org/10.36995/j.masingenio.2019.01.02.004

 

Avaliação da Influência da Temperatura de Compactação no Desempenho de Misturas Asfálticas Quentes e Mornas a Partir de Análises Mecanicistas

 

Paola Nadine Johann Külzera*, Fábio Pereira Rossatoa, Tânia Betina S. Spiesa

 

aUniversidade Regional do Alto Uruguai e das Missões – URI Campus Santo Ângelo, Rio Grande do Sul – Brasil.

 

pnjohannk@gmail.com, fabiorossato@san.uri.br, taniaspies@yahoo.com.br

Resumo

No Brasil, a mistura asfáltica a quente, mais conhecida como CA (Concreto Asfáltico), é a mais tradicionalmente utilizada na pavimentação devido às boas propriedades mecânicas que apresenta. A fabricação da mesma por meio de usinas de asfalto é considerada uma fonte de poluição ambiental quando se atenta ao excessivo consumo energético exigido para atingir a temperatura determinada em projeto, tanto dos agregados e ligante como da mistura asfáltica em sua composição final, tendo como consequência produção demasiada de poluentes. No entanto, surgem as misturas mornas, que tem como principal característica a redução da temperatura de usinagem e compactação, com consequente redução na emissão de poluentes e menor impacto nas áreas de abrangência dos empreendimentos. Logo, o presente trabalho objetivou avaliar a influência da temperatura de compactação no desempenho à fadiga de misturas asfálticas quentes e mornas, através de análises mecanicistas pelo Software SisPav e de cálculos, para determinação do desempenho à fadiga nos pavimentos. Percebeu-se que mesmo com a redução de temperatura de compactação as misturas mornas obtiveram melhores resultados, e as misturas quentes apresentaram redução notável de desempenho à fadiga quando compactadas a temperaturas não ideais, resultando em fissuração precoce do pavimento.

Palavras Chave – Concreto asfáltico (CA), Misturas asfálticas, Temperatura de compactação. Análises mecanicistas, Propriedades mecánicas.

Abstract

In Brazil, the hot asphalt mix, better known as CA (Asphalt Concrete), is the most traditionally used in paving due to its good mechanical properties. The manufacture of the same by means of asphalt plants is considered a source of environmental pollution when it is taken care of the excessive energy consumption required to reach the temperature determined in the design of both the aggregates and binder and the asphalt mixture in its final composition, production of pollutants. However, warm mixtures arise, which has as main characteristic the reduction of the temperature of machining and compaction, with consequent reduction in the emission of pollutants and less impact in the scope areas of the enterprises. Therefore, the present work aimed to evaluate the influence of compaction temperature on the fatigue performance of hot and warm asphalt mixtures, through mechanistic analyzes by SisPav Software and calculations, to determine the performance of pavement fatigue. It was observed that even with the reduction of compaction temperature the warm mixes obtained better results, and the hot mixtures presented a remarkable reduction of fatigue performance when compacted at non-ideal temperatures, resulting in early cracking of the pavement.

Keywords - Asphalt concrete, Asphalt mixtures, Compaction temperature, Mechanistic analyzes, Mechanical properties.

SÍMBOLOS

Nf Número de repetições de carga necessários para atingir a ruptura por fadiga.

εt Deformação específica de tração da camada asfáltica.

1. Introdução

A mistura asfáltica a quente, também conhecida como Concreto Asfáltico (CA) ou Concreto Betuminoso Usinado a Quente (CBUQ) é “uma mistura asfáltica executada em usina apropriada, constituída de agregado mineral graduado e cimento asfáltico, espalhada e comprimida a quente, com características de estabilidade, vazios e relação betumes-vazios definidas nas especificações de serviços” (PINTO; PREUSSLER, 2010, p.14) [1]. Segundo Balbo (2007) [2], é considerado o mais comum e tradicional pavimento utilizado no país.

Bernucci et al. (2008) [3], atenta que o comportamento do cimento asfáltico de petróleo (CAP) utilizado é distinto frente às variações da temperatura e pode variar desde semissólido a temperaturas baixas, viscoelástico à temperatura ambiente e líquido a altas temperaturas.

Uma das principais dificuldades na execução das misturas quentes é a obtenção da temperatura de compactação definida em projeto, devido à perda de temperatura da mistura asfáltica durante seu transporte, fato que fica mais evidente quando em grandes distâncias de transporte.

Vários fatores colaboram para tal perda. No estado do Rio Grande do Sul, marcado por clima subtropical definido por verões muito quentes e invernos extremamente rigorosos, as baixas temperaturas nesse período do ano somadas à grande variação diária de temperatura ambiente dificultam a obtenção da temperatura de compactação e a garantia do grau de compactação da mistura asfáltica em questão, o que acaba por exigir grande eficiência energética das usinas de asfalto e consequente lançamento demasiado de poluentes ao meio ambiente.

Nesse contexto, o setor rodoviário tem buscado desenvolver novas tecnologias no campo da pavimentação, que contribuam de alguma forma com a vida de serviço dos pavimentos brasileiros. Logo, surgem as misturas asfálticas mornas, que visam tornar trabalháveis as misturas asfálticas a temperaturas mais baixas que as convencionais misturas a quente reduzindo a temperatura de usinagem. Estas diferem na sua composição pela utilização de aditivos redutores de viscosidade.

Com a redução de temperatura na usinagem e de compactação das misturas asfálticas, pode-se atentar para os benefícios relacionados ao meio ambiente e a qualidade da pavimentação, como por exemplo: redução do consumo energético, menor emissão de poluentes atmosféricos, menor exposição aos trabalhadores de pavimentação, redução do envelhecimento asfáltico, aplicação em locais de clima frio e possibilidade de se transportar a mistura asfáltica a maiores distâncias entre pista e usina (MELLO, 2012) [4]. A Figura 1 apresenta nitidamente a emissão de gases de mistura a quente e de misturas mornas.

Fig. 1. Comparação de Emissão de Gases de Misturas Quentes e Mornas (Mello, 2012).

D’Angelo et al. (2008) [5] apresenta dados sobre a redução de emissão de gases em usinas que utilizam o processo de produção de misturas mornas em alguns países da Europa, conforme Tabela 1, adaptada de D’Angelo et al. (2008).

 

 

Tabela 1. Emissão de gases em diferentes países.

 

Outro benefício das misturas asfálticas mornas é a melhoria nas características de fadiga, conforme Merighi (2015) [6], devido à redução do envelhecimento que ocorre durante a usinagem. A fadiga, de acordo com Balbo (2007), refere-se ao fato de que muitos materiais, quando sucessivamente solicitados em níveis de tensão inferiores àqueles de ruptura, pouco a pouco desenvolvam alterações em sua estrutura interna, que resultam na perda de características estruturais originais. Diante disso, gera um processo de micro fissuração progressiva que resulta no desenvolvimento de fraturas e, consequentemente, no rompimento do material.

Quando conhecidos os estados de deformação e tensão das camadas constituintes de um pavimento, os mesmos podem ser relacionados à modelos de degradação por fadiga, e ser então realizada uma análise estrutural/mecanicista. Para isto, ao longo das décadas foram desenvueltos vários softwares de análise estrutural do pavimento asfáltico. Um desses softwares é o SisPav, que utiliza a teoria da elasticidade para verificar os danos acumulados por fadiga no revestimento asfáltico.

Ainda, existem diferentes modelos matemáticos de desempenho, que funcionam no dimensionamento como limites para a determinação das espessuras de cada camada do pavimento. Dentre os modelos de fadiga, segundo Rossato (2015) [7], o modelo proposto pela Federal Highway Administration (FHWA) foi calibrado a partir de dados obtidos em pistas experimentais da AASHO Road Test. A formulação do modelo é apresentada em (1), onde Nf= número de repetições de carga para atingir a ruptura por fadiga e εt = deformação específica de tração da camada asfáltica.

(1)

 

2. Metodologia

Visando analisar a influência da temperatura de compactação de misturas quentes e mornas por meio de análises mecanicistas, primeiramente determinou-se a estrutura tipo do pavimento com suas respectivas camadas e módulos de resiliência (MR). A estrutura compôs-se de revestimento, base, sub-base e subleito, com alteração somente na camada de revestimento de acordo com o tipo de mistura.

Quanto à matriz experimental, foram reproduzidas por Haas Júnior (2015) [8] em laboratório 5 misturas asfálticas distintas, sendo 3 misturas a quente e 2 misturas mornas, ambas enquadradas na Faixa C do DNIT 031/2006-ES. Adotou-se como mistura de referência a mistura a quente compactada na sua temperatura ideal de compactação, 150°C (REF). Também foram reproduzidas duas misturas a quente, mas com diferentes temperaturas de compactação comparadas com a mistura referência que foram de 140°C (REF-10°C) e 130°C (REF-20°C). E por final, foram reproduzidas duas misturas mornas com o uso de 0,5% do aditivo Evotherm em relação ao teor de CAP utilizado e compactadas a temperatura de 140°C (E10°C) e 130°C (E-20°C).Os módulos de resiliência foram obtidos por Haas Júnior (2015) a partir de ensaios de resistência e os resultados estão apresentados na Tabela 2.

 

Tabela 2. Módulo de Resiliência.

Fonte: Haas Júnior (2015).

Para as camadas de base e sub-base, foram adotados os materiais BGS (brita graduada simples) e MS (macadame seco), respectivamente, de MR’s definidos por Balbo (2007), como 350 MPa para o material da base e 250 MPa para a sub-base, além do coeficiente Poisson para cada camada. Para o subleito, os valores de MR definidos em alto, médio e baixo como 150 MPa, 100 MPa e 50 MPa, respectivamente.

Após estas definições, foi determinada e analisada a deformação de tração na fibra inferior do revestimento através do Software SisPav, pelo eixo Y, onde ocorre a mesma. A Figura 2 apresenta a posição de análise 1, ou seja, o eixo de simetria.

Fig. 2. Esquema da estrutura a ser analisada.

Para determinar o desempenho a fadiga frente às misturas propostas e temperaturas de compactação por meio de modelos matemáticos, foi definido o modelo de fadiga proposto por FHWA (2006). Assim, propôs-se a matriz experimental apresentada na Tabela 3, que apresenta os valores de MR para cada camada.

 

 

Tabela 3. Valores de módulo de resiliência de cada camada.

 

Por fim, a estrutura tipo do pavimento ficou definida de acordo com a Tabela 4. Onde os valores de MR utilizados para a camada de revestimento foram variadas, de acordo com os resultados médios obtidos na Tabela 3.

Tabela 4. Estrutura tipo do pavimento.

 

No Software SisPav foram inseridos os valores acima citados e definido o tipo de carregamento. Como veículo utilizado para a simulação, adotou-se o eixo padrão, eixo simples de rodagem duplas (ESRD), de características apresentadas na Tabela 5.

Tabela 5. Características do carregamento de eixo padrão.

3. Resultados e Discussões

Foram analisadas quinze estruturas, sendo as cinco primeiras de resistência baixa, as intermediárias de resistência média e as cinco últimas de resistência alta, conforme apresentado na Tabela 3, onde cada tipo de solo portou misturas quentes com três temperaturas diferentes, e misturas mornas com duas temperaturas diferentes, isto para analisar a temperatura adequada de compactação para os diferentes tipos de solo.

Os resultados encontrados pelo SisPav da deformação de tração (Ey) no eixo de simetria de cada estrutura são apresentados na Tabela 6, onde observa-se que as misturas asfálticas a quente apresentaram maior deformação independentemente ao tipo de solo, com solo de baixa resistencia apresentando deformação relativamente maior aos outros solos. As misturas mornas apresentaram valores de deformação inferiores às misturas de CA.

Com os resultados da deformação de tração no eixo de simetria de cada estrutura, foram realizados os cálculos da determinação do número de repetições de carga (Nf) em determinado carregamento até o pavimento atingir ruptura por fadiga (vida de serviço do pavimento), de acordó com o modelo proposto por FHWA (2006). Os resultados obtidos por tais cálculos também são apresentados na Tabela 6.

 

Tabela 6. Resultados de desempenho à fadiga para cada estrutura.

 

Através da tabela anterior observa-se que, se comparadas as estruturas 2 e 3 das misturas asfálticas quentes, a mistura 2 apresentou praticamente o dobro de repetições de carga da estrutura 3 até atingir a fadiga, influenciada pela temperatura de compactação.

Quando compara-se a estrutura 14 de misturas mornas e a estrutura 12 de misturas quentes na temperatura de 130°C, observa-se que o número de repetições de carga necessário para a mistura morna fadigar foi 16,3% superior que a mistura a quente.

Os resultados obtidos podem ser comparados e analisados através do Gráfico 1, onde fica nítido o melhor desempenho das misturas mornas (MM) em relação às quentes (MQ). Percebe-se também que, quanto mais resistente o solo, maior o desempenho de ambas misturas frente a fadiga.

Gráf. 1. Análise das Misturas em Diferentes Tipos de Solos.

 

Logo, espera-se que a vida de serviço das misturas asfálticas mornas seja superior à das misturas usinadas a quente.

4. Conclusões

A presente pesquisa buscou avaliar a influência da temperatura de compactação de misturas asfálticas frente à fadiga, uma vez que novas tecnologias na área de pavimentação, como as misturas asfálticas mornas, permitem a redução de tal temperatura e por conseguinte, a redução da temperatura de mistura do ligante e agregados e da exigência energética das usinas de asfalto, que são fontes de emissão de gases e poluição ambiental.

Para tanto, foram estudadas misturas quentes e mornas em diferentes temperaturas de compactação e em diferentes tipos de solo, para um mesmo teor de ligante. Os módulos de resiliência adotados para as estruturas foram obtidos por Haas Júnior (2015). Foram realizadas análises mecanicistas com o auxílio do Software SisPav e analisado o desempenho da fadiga através de cálculos propostos por FHWA (2006).

Com os resultados obtidos, verificou-se que as misturas quentes quando compactadas abaixo da temperatura ideal tiveram redução acentuada nos valores de MR, repercutindo diretamente no desempenho das mesmas, apresentando maior deformação de tração que as misturas mornas. Quanto maior a deformação por tração, menor foi o número de repetições de carga necessários para atingir a ruptura por fadiga, ou seja, existe a tendência de fissuração e rompimento precoce do pavimento.

Sabe-se que a redução da temperatura de compactação tende a aumentar o volume de vazios, reduzindo os parâmetros de resistência. Contudo, as misturas mornas, que se utilizam de aditivos redutores de viscosidade, apresentaram resultados melhores frente à deformação, mesmo quando compactadas a temperatura abaixo do ideal e em solo de baixa resistência, oportunizando maior vida de serviço ao pavimento.

Considerando que durante o transporte da mistura asfáltica ocorre perda de temperatura da mesma, ainda mais quando em locais que apresentam fatores climáticos rígidos como no sul do Brasil, onde o clima subtropical é marcado por invernos rigorosos e grande variação diária de temperatura ambiente, as misturas mornas apresentaram-se como boa alternativa para distâncias de transporte muito grandes e solos de baixa resistência.

Assim, fica evidente que a utilização dessas misturas garante uma melhora no pavimento, uma vez que apresentaram resultados semelhantes ou ligeiramente superiores às misturas a quente. Por fim, ressalta-se a importância ambiental das mesmas, já que acabam por reduzir o consumo energético das usinas de asfalto, gerando menos gases poluentes ao ambiente e um menor impacto direto à flora existente nas áreas de influência direta dos empreendimentos.

Referências

[1] PINTO, Salomão; PREUSSLER, Ernesto Simões. Pavimentação rodoviária: conceitos fundamentais sobre pavimentos flexíveis. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Synergia: IBP, 2010.

[2] BALBO, José Tadeu. Pavimentação asfáltica: materiais, projetos e restauração. São Paulo: Oficina de Textos, 2007.

[3] BERNUCCI, L. et al. Pavimentação Asfáltica: Formação básica para engenheiros – Rio de Janeiro: PETROBRAS: ABEDA, 2008.

[4] MELLO, Daniella. Avaliação da adição de evotherm no comportamento de misturas asfálticas em laboratorio e no desempenho em campo. 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2012.

[5] D’ANGELO, et al. Warm mix Asphalt: European practice. National Cooperative Highway Research Program. Virginia, 2008.

[6] MERIGHI, Cecília Fortes. Estudo do comportamento de misturas asfálticas mornas em revestimentos de pavimento com adição de borracha moída de pneu. 2015. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Transportes) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015.

[7] ROSSATO, F. P. Avaliação do fenômeno de fadiga e das propriedades elásticas de misturas asfálticas com diferentes ligantes em variadas temperaturas. 2015. Tese (Mestrado)- Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2015.

[8] HAAS JUNIOR, Antônio. Avaliação da influência da temperatura de compactação nas propriedades mecánicas e elásticas de misturas asfálticas mornas e quentes. 2015. Trabalho de conclusão de curso – Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Santo Ângelo, 2015.